terça-feira, 16 de novembro de 2010

Os perigos da adultização precoce.

Confira nesta edição a segunda e última parte do artigo Os perigos da adultização precoce.

1. Cantores, pregadores e mestres mirins

Muitas crianças têm perdido a infância por conta de certos "educadores" que no intuito de realizarem nelas o que gostariam para si mesmos, podam-lhes a alegria, a imaginação, a inventividade e o divertimento. Às vezes, são pais que gostariam de ser cantores, pregadores ou professores de Escola Dominical, mas que por falta de vocação natural, ou até mesmo de uma chamada divina específica, projetam nos filhos, seus sonhos ou objetivos não-realizados.
Quem nunca viu um menino com menos de dez anos vestido de terno e gravata, cantando, pregando ou dirigindo um culto? E na Escola Dominical, quantas meninas e meninos são colocados à frente de uma turma, quando na realidade, deveriam estar aprendendo em uma classe de sua faixa-etária?

Para que serve a infância?

A criança não é um ser incompleto; é um ser em perspectiva de transformações. É completa como criança, ajustada à sua vida de criança, adaptada a determinado estágio de desenvolvimento, tanto quanto uma semente é completa como semente, ou a lagarta é completa como lagarta.

Possuindo todas as características do adulto, em uma forma própria, a sua fisionomia particular não deve ser interpretada como falha a remover, mas como um momento do seu processo evolutivo para a maturidade mental do adulto.

"A infância serve para imitar e brincar. A criança é criança, não porque não tem experiência da vida, ou porque não é grande, mas é criança para a aquisição dessa experiência, e é pequena para tornar-se grande" (Claparêde).

A criança não é estática; porém, dinâmica. A criança é um vir-a-ser, com os seus interesses próprios e atividades peculiares. É um complexo de possibilidades, que a interação do organismo e do meio em momentos propícios transforma em realizações.

As formas de comportamento das crianças parecerão puerilidades, sob o ponto de vista do adulto que as interpreta em relação a si mesmo. Àqueles, porém, que se colocam na posição infantil, essas manifestações assumem importância capital e condizem perfeitamente com a condição de ser imaturo.

A criança é criança, não porque brinca, mas brinca porque é criança. Não se pretende que deixe de brincar para que se torne adulta, mas que é preciso que brinque para que venha tornar-se adulta.

"Quanto mais longa a infância de uma espécie qualquer, tanto maiores serão as suas capacidades e inteligência" (Kilpatrick).

O que é ser criança? O que diz a pedagogia atual?
Na verdade, o que se fala hoje a respeito da infância não condiz com a realidade das nossas crianças, nem com o que fazemos com elas.
É preciso resgatar a verdadeira infância, na qual há um mundo de fantasia, imaginação, criatividade e brincadeiras. Aqui entra o papel do pedagogo cristão, pois como estimulador do conhecimento, poderá trazer para o espaço da Escola Dominical desafios e valores que conduzam seus alunos a descobrirem a verdadeira identidade da criança, segundo os ensinamentos da Bíblia.
Poderá trabalhar dentro dos estágios de desenvolvimento da criança, incentivá-la na leitura da vida e não apenas da Palavra, estimulando-a a ler nas "entrelinhas" e a constituir-se como um cidadão capaz de transformar sua própria realidade. Como educador evangélico poderá também questionar junto aos educandos a postura das mídias e se posicionar como um instrumento iluminador de pensamentos e ideias.
Aqui entra a intervenção dos pais, professores de Escola Dominical, pastores, e de toda a sociedade, que precisa romper com os muros do doutrinamento consumista. Devemos exigir dos setores sociais, inclusive da própria família, da igreja e dos setores de comunicação, uma educação que valorize mais o ser do que o ter. Uma censura a ser respeitada, digna do público infantil e até a criação de um código de defesa do telespectador ou leitor de mídias. É preciso acreditar numa educação de qualidade para todos, a qual prepare as crianças para conhecer, fazer, ser e conviver.
A história da criança não deve retroceder a um passado de isolamento, e sim estabelecer-se como a história de um sujeito possuidor de direitos, inclusive o direito de voz e o de não ser manipulado pelos adultos. Está-nos proposto o desafio: protegeremos a infância ou continuaremos a reproduzir os interesses de um sistema que insiste em nos dominar?


Pr. Marcos Tuler é pedagogo, escritor, conferencista e reitor da FAECAD (Faculdade de Ciência e Tecnologia da CGADB).
www.prmarcostuler.blogspot.com

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